sexta-feira, 27 de março de 2009

Parecer De Garcia Pereira Sobre O Modelo De Gestão Escolar - 2º Excerto

No que ao regime jurídico - instituído pelo Decreto-Lei nº 75/2008 - relativo ao modo e processo de designação do Director diz respeito, o certo é que o mesmo se revela de uma enorme complexidade e até de algum confusionismo, que decorrerão afinal da mal disfarçada tentativa de procurar conciliar no seu seio duas realidades distintas e em larga medida contraditórias: por um lado, o processo de “recrutamento” (de entre docentes do ensino público ou particular e cooperativo, qualificados para o exercício de funções de gestão administrativas, financeiras e pedagógicas), apresentado como de natureza “concursal”, e, por outro, a natureza electiva do cargo, imposta pelos princípios consagrados na Lei de Bases acerca da administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino.

Ora, o modo como em concreto o Decreto-Lei nº 75/2008 procura resolver e ultrapassar aquela contradição corporiza-se afinal na estatuição de um estranho e complexo processo que se caracteriza por um primeiro procedimento dito concursal (que não passa, afinal, de uma mera fase de apuramento da verificação dos requisitos definidos como mínimos para a candidatura a uma dada eleição) e por um subsequente processo eleitoral assaz singular, quer por ser indirecto (o Director é eleito, não directamente pelos docentes, pessoal não docente e estudantes, mas sim pelo chamado Conselho Geral, por sua vez composto por representantes não apenas daqueles, como também do município e da comunidade local - o que aliás entendemos estar em violação com o nº 4 do já citado artigo 48º da Lei de Bases - e em número nunca superior a 21), quer por a renovação do seu mandato (chamada de “recondução”) não resultar de qualquer novo processo electivo, mas sim de uma decisão tomada por maioria absoluta dos membros do mesmo Conselho Geral em efectividade de funções. E, para culminar tudo isto, o próprio Sub-Director - que substitui o Director nas suas faltas e impedimentos e no qual este pode delegar e subdelegar quaisquer das suas competências - é afinal pura e simplesmente nomeado pelo próprio Director e por ele pode ser exonerado a todo o tempo!

Significa tudo quanto antecede que temos hoje, por força do já diversas vezes citado Decreto-Lei nº 75/2008, um singular, confuso e híbrido sistema que não é (nem poderia ser, face aos já indicados princípios básicos constantes da Lei Geral) concursal, sendo certo que, desde que todos possuam os requisitos mínimos estatuídos nos nºs 3 e 4 do respectivo artigo 21º, o Conselho Geral pode vir a eleger o menos qualificado deles, visto que, como resulta patente dos artigos 22º e 23º, não apenas o relatório de avaliação de candidaturas não tem qualquer carácter vinculativo como o referido Conselho Geral não está, sequer, obrigado ou vinculado a escolher o melhor ou o mais qualificado dos “candidatos”!

Mas também não é verdadeiramente electivo pois, conforme se assinalou já e ao contrário do que resulta dos princípios gerais da Lei de Bases, maxime o seu artigo 46º, nº 4, o dito Director não é designado por eleição directa dos membros da comunidade escolar, como o seu mandato não apenas pode ser renovado sem nova eleição, como também pode cessar, a requerimento do interessado, por mero despacho do Director Regional de Educação (a quem também compete homologar os respectivos resultados eleitorais), ou seja, de um cargo de confiança política governamental.

Acontece porém ainda que, tal como decorre do artigo 21º, o Director pode ser afinal alguém absolutamente exterior à Escola - o que em nosso entender também contraria claramente o mesmo nº 4 do artigo 48º da Lei de Bases, pois que este preceito claramente estipula e obriga a que a direcção de cada estabelecimento ou grupo de estabelecimentos seja assegurada por órgãos próprios, para os quais são democraticamente eleitos os representantes dos professores, dos alunos e do pessoal não docente, o que obviamente só pode significar que os titulares dos ditos órgãos são eleitos directamente pelos professores (e também pelos alunos e pelo pessoal não docente) - e pode até ser exterior ao próprio ensino público, tudo isto enquanto o Sub-Director que substitua aquele nas suas faltas ou impedimentos e em quem aquele pode delegar quaisquer usos das suas amplas competências já o não pode ser, não se alcançando de todo a ratio desta diferença de regras.

Temos assim que o Decreto-Lei nº 75/2008 veio criar um órgão unipessoal não verdadeiramente electivo, escolhido por um órgão colegial restrito onde estão representados elementos que não os previstos no artigo 48º, nº 4 da LBSE, e reconduzível sem novas eleições, podendo ser ocupado por pessoa inteiramente estranha à Escola ou agrupamento de escolas e até ao ensino público, e com amplíssimas atribuições e competências, entre as quais as já citadas de designar os coordenadores da escola, os coordenadores dos departamentos curriculares e os Directores de Turma, de distribuir o serviço docente e não docente, de proceder à selecção de pessoal docente e não docente, de exercer o poder hierárquico em relação a ele, de proceder à selecção e recrutamento de pessoal docente e de intervir no respectivo processo de avaliação !

Publicado por Paulo Guinote, a 27.Março.2009, em
http://educar.wordpress.com/

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